Entre risos e gargalhadas, os copos batem uns nos outros. Mais um brinde. Mais umas gotas de Gin que salpicam alguns de nós. A cada brinde uma nova jura de amizade eterna e o desejo que muitas viagens fotográficas sejam feitas em conjunto. Os ponteiros do relógio, esses não param, e avançam impiedosamente. Não há que reclamar do cansaço, é tempo de confraternizar. São relembradas as aventuras do dia agora prestes a findar. Mais alguns minutos e dou comigo quase moribundo. As vozes dos meus companheiros de viagem ecoam de forma distorcida dentro de mim. É o sinal que falta. É hora de descansar. Vou de encontro à minha cama e caio num sono profundo. Pelo menos era esse o meu desejo. Pouco mais de 50 minutos tinham passado e era hora da alvorada. O silêncio da madrugada é interrompido pelos passos que se escutam no corredor. É o corrupio próprio que antecede uma saída fotográfica tida por todos nós como importante. Não há como disfarçar o nervoso miudinho que se apoderou de todos. Nesta época do ano os dias são longos na Escócia. Amanhece por volta das 2h00 da manhã e anoitece por volta das 23h30. Na rua teima em cair uma chuva miudinha, impulsionada por um vento forte. Saindo de Portree e passados alguns quilómetros, avistamos, ainda que parcialmente, o propósito deste acordar cedo: o icónico Old Man of Storr. O objetivo estava delineado há muito, mas o nevoeiro não nos deixa avistar o famoso dedo de deus, uma das rochas que compõe este conjunto de 3 pináculos gigantes. Sinto receio que cheguemos ao topo e o nevoeiro nos atraiçoe. Nada parece querer ajudar. As chuvas caídas nos últimos dias dificultam a nossa tarefa. Caminhamos sobre um pântano, onde a lama não dá tréguas. A água, vinda dos céus, continua a cair teimosamente. A cada metro subido, o vento fica ainda mais furioso com a nossa presença. Sucessivas paragens para descanso e aqui e acolá uma mão para ajudar o companheiro a ultrapassar uma subida mais acentuada ou uma poça de lama mais funda. Nada nos iria demover do objetivo traçado! Vencidos mais alguns metros e verifico que nem tudo está contra a nossa expedição. Ao olhar para cima e de forma quase milagrosa, o nevoeiro começa a se dissipar. Já consigo avistar o famoso dedo de deus! Todos ganhamos um novo ânimo e um novo fôlego. Já perto do topo avistamos uma tenda. Alguém pernoita por ali. Questionamos se alguém consegue dormir com aquele uivar danado do vento. Não podemos perder o foco. Há um objetivo a cumprir. Estamos perante a última subida. O nosso objetivo está a poucos metros de nós. Mas o desnível é grande. Deixa antever uma vez mais dificuldades. Um último esforço é exigido a todos nós! É quase de gatas e com a ajuda dos tripés – que servem de apoio – que atingimos o topo! É de forma ofegante que alcançamos o pequeno promontório que ali se encontra. Daqui em diante tudo o que avistámos, tudo o que sentimos irá ficar para sempre gravado na nossa memória e jamais conseguirá ser descrito por palavras. Do lado direito, lá está ele – o Old Man of Storr.
Das montanhas ao mar, a paisagem desvanece-se no horizonte, que é até onde a vista alcança.
A luz daquele amanhecer nunca será esquecida por nós. O sol – quando rompeu as nuvens – moldou e deu vida a uma paisagem verdejante que antes da sua presença se apresentava mortiça. O vento continuava a atormentar aquele local inóspito sob a forma de fortes vagas, que teimavam em mostrar toda a sua ira. A chuva já fazia tempo que nos tinha deixado. Os ponteiros do relógio avançam. A luz mudou e ficou menos interessante. Tinha chegado o momento de voltar. Fizemos o caminho de regresso com um rasgado sorriso. Não tínhamos como disfarçar a nossa felicidade pelos acontecimentos das últimas horas. Era hora de um banho revigorante e de um merecido pequeno-almoço, seguido de umas horas de descanso.
Setembro 8, 2024