Naquela manhã, não estávamos tão efusivos como havia acontecido nos últimos dias. No ar, paira um silêncio ensurdecedor, enquanto percorremos o caminho que nos leva ao aeroporto. O fim das férias é gerador destes sentimentos. A melancolia apodera-se de nós e à medida que o brilho no olhar se desvanece, o coração fica cada vez mais apertado. A tristeza invade-nos o estado de espirito e contamina a alma, salpicada com uma boa dose de saudade.
No aeroporto, a azáfama é a de sempre. Corpos que se cruzam. Olhares que se trocam. Decifrar a nacionalidade de cada um que se atravessa no meu caminho, é dos exercícios que mais gosto de fazer. Indiferentes a tudo isto – fruto do hábito – os funcionários do aeroporto executam as suas rotineiras tarefas, ignorando todo este turbilhão de sentimentos, de quem regressa e de quem parte.
Neste último suspiro, antes do embarque, abro a mochila. Mochila essa que havia sido arrumada umas horas antes, diga-se que à pressa. A noite tinha sido longa. Certifico-me que a máquina fotográfica ali se encontra. Meio que escondida, vislumbro uma polaroid, tirada num dos muitos momentos de convívio na ilha de Skye. Naquele pedaço de papel, onde uma imagem foi gravada de forma instantânea, o estado de espirito do grupo é diferente do atual. Todos estão de sorriso rasgado e o olhar com um brilho especial. Neste momento de saudosismo, ganho um ânimo inesperado e por breves momentos esqueço o amargo que me vai na alma.
Deambulo pelos corredores da memória e rapidamente relembro o dia da chegada à ilha. Na carrinha todos riamos, todos conversávamos. Uns mais que outros, é certo, mas a alegria estava estampada nos nossos rostos. Para trás ficava o Eilean Donan Castle. É quando a avisto. A ponte. Não é uma ponte fotogénica, mas também não é só mais uma ponte. Ela será, através dos seus quinhentos metros de extensão, a porta de entrada para a belíssima Ilha de Skye!
Quando chamo a atenção, dos restantes companheiros de viagem, que estamos prestes a entrar na ilha, um histerismo coletivo apodera-se de todos. Um quilómetro percorrido após termos cruzado a ponte, e já alguém exclama: encosta esta sucata para irmos fotografar!
Nessa tarde, deambulámos pelas Fairy Pools. A paisagem é de cortar a respiração. Um cenário que faz jus ao nome. Um enorme vale, onde o rio – encrustado na cordilheira montanhosa – serpenteia de forma ondulante montanha abaixo. Nesse seu caminho, os muitos desníveis que ali se encontram, provocam quedas de água para todos os gostos. O final desse dia estava soturno. Algumas horas haviam passado e estamos agora na pequena baía de Talisker, uma praia selvagem. À rocha negra da montanha que rodeia a baía, junta-se a areia da praia com a mesma cor. O mar, quase que por capricho, encontra-se calmo. Do meu lado direito, avisto uma enorme queda de água, ainda que distante de onde me encontro. Não deixo aquela praia inóspita, sem antes me banhar nas suas águas. Naquele local pouco hospitaleiro, sinto uma estranha sensação de liberdade.
Queres café? Foi desta forma o “regresso” ao presente. Alguns dos meus colegas falam comigo, mas o meu pensamento, esse mantém-se nas recordações que aquela polaroid me traz. Enquanto saboreio o meu café, voltam as memórias, ainda tão imaculadas em mim. Depois das aventuras na baía, o dia seguinte começou bem cedo no Old Man of Storr. Uma caminhada sob condições difíceis. A lama, a chuva e o vento forte, foram um desafio constante às nossas capacidades durante o percurso. Cada metro vencido valeu todo o nosso esforço e empenho! Uma vez no topo, a paisagem é estonteante. Foi o amanhecer mais bonito da viagem. Este dia foi especial!
Seguimos viagem e fomos de encontro ao inconfundível Quiraing! Que cenário! Nem sabia se havia de fotografar ou apenas sentar-me e contemplar. Quando o sol rasgou definitivamente as nuvens, que teimavam em o esconder, o verde, que aqui é a cor dominante, ficou com um brilho e uma intensidade jamais vista! Que regalo para o olhar!
Depois de algumas horas passadas e vários quilómetros percorridos, é hora de visitar o farol mais afamado e fotogénico da ilha, que dá pelo nome de Nest Point Ligthhouse. Uma vez no local, facilmente se percebe a fama almejada. Na sua frente enfrenta as agruras do Atlântico, aqui quase sempre viril e revolto e encontra-se ladeado por abruptas falésias, esculpidas pelo mar e pelo vento. Neste dia o vento soprava com tanta veemência que se tornou quase impossível conseguir fotografar este afamado local.
Um transeunte, carregado com várias malas, esbarra de frente contra mim. Subitamente regresso ao aeroporto. Depois de aceite o pedido de desculpas, e a uma hora de distância do embarque, regresso às recordações do último dia na ilha de Skye.
A vila de Elgol é famosa pela sua praia, que tem uma vista privilegiada sobre as Cuillins – a cordilheira montanhosa mais alta da ilha. A negritude das nuvens, já deixava antever a água que dos céus iria descer de forma violenta momentos depois. Antes do dilúvio, ainda fotografámos, sempre sob o olhar atento daquele céu ameaçador. No regresso ao hotel, a ponte de Sligachan também foi alvo da mira das nossas objetivas. Nem a multidão que ali se encontrava nos demoveu do nosso objetivo.
No dia seguinte, e após uma noite bem dormida, lá estava ela novamente – a ponte. Desta vez sem euforias e sem histerismos na hora de a cruzar. É a hora do regresso. Ainda não a tinha cruzado e já um saudosismo arrebatador se tinha apoderado de mim. Para trás deixávamos uma ilha, que durante 4 dias nos encantou e deliciou com toda a sua energia e vitalidade. Impossível não sentir esta agonia na hora do regresso. Por falar em regresso, o tempo voa. É hora de embarcar. Rapidamente e sem pensar muito, arrumo a polaroid na desarrumada mochila e com ela, por agora, as memórias da Ilha de Skye. A seu tempo e com um olhar mais distante, irei saborear todos os momentos ali vividos. O tempo avançou. É hora de embarcar.
Setembro 8, 2024